MESAS-REDONDAS

MESA-REDONDA 1. A voz que ressoa do vazio usurpa teu nome: a perdição amorosa de Orfeu segundo Saramago

DEBATEDORES

  • Prof. Me. Matheus Pereira de Freitas (UFPB - LIGEPSI)
  • Prof. Me. Guilherme Ewerton Alves de Assis (UFPB - LIGEPSI)
  • Prof. Dr. Eider Madeiros (UFPB - PPGL)

Dia 17 de julho às 9 horas da manhã (horário de Brasília) - PRESENCIAL - Sala de Multimídia C - CCHLA

RESUMO GERAL: Atento aos indômitos descompassos das relações humanas, em meio aos ressumbres corrompidos pelos ultrajes das fantasias, a voz saramaguiana compungira-se ante as sangrias incólumes de Eros, sejam os frutos ressequidos pelo desamparo indolente, nas catástrofes parasitárias do Ano da morte de Ricardo Reis (1985), ou mesmo pelo enxague e fortuito (des)encontro entre as almas condenadas, ornadas pelas intermitências da morte (2005); cataclismas que refratam as idiossincrasias do amor, exprimindo a dor de seus despropósitos e as alegrias de suas desilusões a partir das deflagrações de seus múltiplos nomes. Com efeito, no caleidoscópio sintático das narrações do escritor português, fado melífluo de suas incontáveis faces, desvela-se a vulnerabilidade "ourobórica" das paixões, cujas condenações arranjam-se nas raízes de seus (des)propósitos, as quais, mesmo no maior e mais duradouro de seus idílios, maculam-se pela ruína incontornável que margeia cada célula vivente. Contudo, nas expressões devastadoras desse caos fulgurante, a centelha amorosa, por vezes, desordena o império tanático pela própria vulnerabilidade de suas chamas, clamantes à trágica desilusão que as aguarda, receosas por seu gozo derradeiro. Assim, nas volúveis metástases do amar, urdem-se os imperativos desta mesa-redonda que, sensível às particularidades saramaguianas e amparada pelos alicerces teóricos da psicanálise, trilhará os descompassos de Orfeu em sua saga desvairada pelas ilusões da paixão que declamarão suas queixas: no labiríntico exílio de Caim (2009), maculado pela pústula de seu desamparo; nas incorpóreas perseguições de José, atado, umbilicalmente, pelos sussurros de Todos os nomes (1997); e pelo vislumbre mefítico do desespero, com os amantes engolfados nos contornos indefiníveis do Ensaio sobre a cegueira (1995).

Palavras-chave: Amor; Desilusão; Psicanálise; Saramago.


DOS PARAÍSOS EDÊNICOS DA INFÂNCIA AO FUTURO DE UMA (DES)ILUSÃO: EMBLEMAS CAÍMICOS, ESCALAVRADOS POR DEUS, NA FRONTE DO DESAMPARO

Prof. Me. Guilherme Ewerton Alves de Assis

Em que pese a reverência ao fenômeno religioso como uma manifestação cultural imersa nos sentidos, Freud se dedica, em obras como O mal-estar na cultura (1929) e O futuro de uma ilusão (1927), inabalável em sua empreitada, a desmontá-lo enquanto forma de conhecimento do mundo, visto que o considera a origem da alienação, da superstição, e um fenômeno sustentado pelos recônditos do imaginário. Contudo, o desamparo humano, conforme o entendimento freudiano, não é fruto nem de forças exteriores, como a religião propaga, nem das vicissitudes corporais ou das heranças familiares; na complexidade das narrativas idiossincráticas de cada sujeito, entrelaçada às forças pulsionais que residem em seu corpo e que se inscrevem na constituição do psiquismo, encontramos os germes do desamparo psíquico, manifestando-se através do corpo e da alma. Os sintomas obsessivos, enquanto rituais religiosos do neurótico, revelam-se, na análise de Freud, como a religião e suas cerimônias culturais, constituindo-se no grandiloquente sintoma neurótico da humanidade. Ergue-se, sob esta perspectiva, a presente discussão, que se aprofundará no célebre romance Caim (2009), de José Saramago, com o propósito de escrutinar, numa intricada interlocução com as elaborações fantasísticas da neurose, as raízes do desamparo, entranhadas de modo preponderante na infância, assim como as engenhosidades dos rituais religiosos, capazes de erigir um Deus-Poderoso para que os fiéis lhe dediquem seu amor. Este Deus, no percurso tortuoso que acompanha a saga de Caim pela ancestral história cristã, carrega consigo, conforme profetizado, diversos sintomas que sugerem uma conduta afetada. Contudo, há uma aclamação de Caim que, irrompendo no romance, desvela as virtudes desordenadas de um Deus mesquinho, provocador de infortúnios aos homens, mesmo àqueles que o idolatram e perpetuam sua imagem nos escritos e na crença como uma fonte inquestionável de benefícios espirituais e graças para os males que assolam os mortais. Noutros termos, deparamo-nos com as ilusões amorosas dos devotos, enquanto, ironicamente, permanecem desamparados das tutelas divinas. Num percurso heterodoxo, Caim, filho de Adão e Eva, assim como nós, descendentes de pais expulsos do paraíso, habitantes de terras afligidas pelas desmesuras alheias, percorre cidades em decadência, estábulos, palácios de tiranos e campos de batalha, testemunhando uma guerra secular, e de certo modo involuntária, entre criador e criatura. Ao revisitar episódios bíblicos conhecidos, mas sob uma perspectiva inteiramente diferente, Caim, colocado em um altivo jegue pelo Deus que se encontra em disputa com sua própria administração, enfrenta, em conjunto com seu inusitado meio de transporte, as armadilhas temporais que teimam em atraí-los. A Caim, cuja fronte ostenta a marca do Senhor e, portanto, encontra-se protegido das iniquidades humanas, resta aceitar o destino amargo e condescender com o criador, a quem não dedica os mais benevolentes julgamentos. À semelhança do diabo n'O Evangelho segundo Jesus Cristo (1991), o Deus retratado aqui não se enquadra nos padrões usuais das homilias; ao reinventar o Antigo Testamento, Saramago redefine também seus principais protagonistas, conferindo-lhes uma roupagem simultaneamente complexa e irônica, cujo tom de farsa apenas acentua. Diante do desamparo existencial, renegado dos paraísos edênicos da infância e, por conseguinte, almejando o retorno à figura do patriarca morto, inicialmente como totem e posteriormente como deus, o ser humano, em um anseio nostálgico pelo pai, busca tutelas religiosas capazes de ampará-lo contra a finitude, a fragilidade corpórea e a hostilidade dos pares.


SANGRIAS DO SILÊNCIO, RELICÁRIOS DA (DES)ILUSÃO: A SELVAGERIA TUMULAR USURPA O AMOR EM TODOS OS NOMES, DE JOSÉ SARAMAGO

Prof. Me. Matheus Pereira de Freitas

Na vertigem mefítica da noite, subjugado pelo olor de seu choro estridente, o pequeno rebento clama por uma presença amorfa, ainda inominada, fonte de seu ódio perpétuo, erigido pela própria impossibilidade de fusionamento para com o seu amparo embriagante, para com uma voz que antecede o advento do dito. Em verdade, a palavra materna, quando redentora, envelopa o inaudito desespero do infante, enleando-o a uma sonoridade, eternamente, infamiliar, agrilhoada a uma condição fantasmática já que, mesmo no encontro idílico, sua escuta será marcada pelo desarranjo de suas ressonâncias. Eis, em termos "melismáticos", os sentidos do amor para o pensamento psicanalítico, capaz de transcrever o desencontro perpétuo entre o outro e o si mesmo, embebidos, cada um, por suas próprias fantasias constitutivas. Ademais, acaso atentemo-nos aos sentidos expressos pela experiência amorosa, encontrar-nos-emos ante suas incertas desilusões, fios nos quais, desesperadamente, atamo-nos, tal qual, n'outrora, à voz (des)alentosa que nos guiara ao leito. Não obstante, na autêntica busca dessas veredas esquecidas, ter-se-ão os enleios ágrafos de Todos os nomes (199, romance de José Saramago, o qual se concentra na desesperançosa busca do Sr. Jose, arquivista da Conservatoria Geral, cujo cotidiano é abalado pelo clamor silencioso de uma mulher, contornada apenas pela nomeação de seu registro, mas, indelevelmente, incorpórea. Logo, em meio ao êxtase proclamado pelos rumos abismais do silêncio, o protagonista guia-se em sua busca desvairada, numa perseguição que, paulatinamente, (des)mascara a fantasmagoria do fervor amoroso, desvelada pela misericordiosa ausência da inexistência, eco que impulsionará o personagem aos estertores de sua (des)ilusão. Alhures, será pela constante solidão do ignoto, erguida pela labiríntica narração saramaguiana, aos moldes kafkianos, que José se aproximará do fantasma inominado de sua obsessão, prorrompendo-o aos rumos ominosos de uma vida desperta para a morte. Portanto, a partir da perspectiva freudiana, no que tange ao futuro de uma ilusão (1927), este trabalho orientar-se-á nas brumas nefastas da fantasia amorosa e nas maldições sacrílegas que imperam o desejo a embriagar-se em suas armadilhas.

Palavras-chave: Amor; Desilusão; Psicanálise; Saramago.


O CAOS INSOLÍCITO DO FLAGRA OBSCENO EM ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA

Por Prof. Dr. Eider Madeiros

Existe um ditado popular que carrega suas razões na bravata de que "o que os olhos não veem, o coração não sente", e empunha uma verdade sobre a fantasia amorosa, na medida de sua configuração mutuamente visualista, afetiva, sentimental e reativa, da carne à alma, do corpo ao espírito. Diante da catástrofe de uma treva branca que irrompe como epidemia no romance distópico Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago (1995), o colapso humano revela suas obscuridades mais obscenas, a imprimir nos anversos do contradito as fragilidades do interdito, do que fingimos não ver, em verdade, para não fazer o coração sentir mais do que já lhe faz condoer, do que já lhe aterroriza, desde o aparelhamento psíquico, nos rastros imprecisos e assombrosos da decadência, do abandono e da desilusão. Sobretudo, diante do sofrimento generalizado de um trauma coletivo no limiar de uma ruptura civilizatória, como isso se daria nas cenas da décima primeira parte da obra, em que a correlação narrativa entre a rapariga dos óculos escuros, o médico e a mulher do médico sugere a desaparição do obsceno por meio do silenciamento da fantasia do que não se enxergasse, mas termina por se ver? Refletindo sobre essas questões, propomos indagações sobre o papel do olhar, em terra de cegos pelo mal-estar do recalque e pelo real da angústia, conforme Freud e Lacan, como virada crítica, ao estilo saramaguiano, cujas coordenadas provocam uma extensão do caos no obsceno sexual e em seus esgotamentos na relação amorosa.

Palavras-chave: Literatura portuguesa; Psicanálise; Obsceno; Desilusão.


MESA-REDONDA 2. Dos umbrais da tradição à redenção dos corpos: (re)visitando o imperioso feminino em José Saramago

DEBATEDORES

  • Profa. Ma. Wanessa de Góis Moreira (UFPB - LIGEPSI)
  • Profa. Ma.  Maria Aparecida Tavares Marques (UFPB - LIGEPSI)
  • Profa. Ma. Fernanda Diniz Ferreira (UFPB - PPGL)

Dia 17 de julho às 14 horas (horário de Brasília) - PRESENCIAL - Sala de Multimídia C - CCHLA

RESUMO GERAL: Nesta mesa-redonda, planejamos explorar as representações do feminino nas narrativas de Saramago, examinando de perto as nuances cruciais presentes nas personagens femininas e protagonistas. Buscaremos compreender as subjetividades, a diversidade de representações e as singularidades das mulheres que permeiam a obra de Saramago. O texto literário será nossa principal fonte de análise, fundamentando nossas discussões em uma variedade de estudos teóricos. Ao mergulharmos nas obras de Saramago, pretendemos desvendar como o autor constrói e desconstrói os arquétipos femininos, destacando as complexidades que moldam as personagens. Nosso objetivo não é apenas identificar padrões, mas também explorar as múltiplas facetas da experiência feminina, enriquecendo a compreensão das mulheres retratadas nas narrativas saramaguianas. Utilizando o texto literário como elo central, pretendemos fomentar uma discussão profunda, embasada em teorias diversas, para iluminar as diversas dimensões que as representações femininas assumem na rica tapeçaria literária de Saramago. Além disso, almejamos examinar como as representações femininas nas obras de Saramago dialogam com as questões sociais e políticas de sua época, contribuindo para uma análise mais ampla do papel das mulheres na sociedade. Buscaremos compreender como o autor transcende estereótipos, oferecendo narrativas que desafiam as expectativas convencionais sobre o feminino. A interseção entre forma literária e conteúdo será explorada, destacando como as escolhas estilísticas de Saramago influenciam a representação das mulheres em suas histórias. Essa abordagem multifacetada visa enriquecer nosso entendimento não apenas das personagens, mas também do impacto cultural e social das narrativas saramaguianas na construção da identidade feminina.


Da condescendência de Eros à insurgência de Lilith: a efervescência do feminino saramaguiano, em O conto da Ilha Desconhecida

Por Profa. Ma. Wanessa de Góis Moreira

Com uma poética essencialmente subversiva, José Saramago explora a fusão causticante da subserviência e da 'busca' da liberdade feminina, por tempo, efervescente na sociedade ocidental. Desse modo, a escrita saramaguiana celebra a rebelião do feminino que reivindica, vorazmente, explorar, de maneira soberana, as zonas soturnas de suas sexualidades. Nesse contexto, destaca-se a obra O Conto da Ilha Desconhecida, que exibe, nas linhas literárias, as entranhas lascivas do corpo e do desejo de uma personagem-protagonista sem nome. A narrativa exprime uma representação do feminino que emerge de elementos multifacetados e simbólicos, os quais se carreiam pela erupção do Eros e pela voracidade Lilithiana, ambas esfinges arquetípicas, por vezes, ainda caras à mulher no contexto patriarcal. Portanto, investidos pelas cifras da transgressão, analisaremos a dinâmica de poder e domínio da mulher sem nome enquanto suas interações refletem as possibilidades de resistência frente às estruturas hegemônicas.


Por Profa. Ma. Fernanda Diniz Ferreira (UFPB - PPGL)

Resumo: Durante muitos séculos, as pressões de um patriarcado virulento e opressor fizeram com que o papel das mulheres na sociedade fosse reduzido a ser mãe e esposa ou prostituta. Diante de tal cenário, a literatura serviu-se destes estereótipos para representá-las. Na obra Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago, temos a desconstrução desses estereótipos de gênero, através da presença de personagens femininas como a mulher do médico, a rapariga dos óculos escuros e a mulher do primeiro cego. A princípio entendemos que, elas não têm nomes próprios e são reconhecidas por causa de seus companheiros ou da profissão que possuem. No entanto, a construção de personagens femininas na produção literária de José Saramago ultrapassa imagens, discursos e, principalmente, silenciamentos. Nessa medida, as personagens ganham um lugar de destaque na narrativa saramaguiana, visto que as ações por elas praticadas rompem com os moldes convencionais da mulher de sua época, trazendo à tona a voz feminina e seu percurso de autoconhecimento.

PALAVRAS-CHAVE: Representação feminina; patriarcado; construção; Saramago


A representação do feminino em Don Giovanni ou o Dissoluto: a mulher e seu poder sedutor

Por Profa. Ma. Maria Aparecida Tavares Marques (UFPB - LIGEPSI)

A mulher sempre foi colocada como objeto de desejo masculino, um ser frágil, sensível e vulnerável. A sua fala, por vezes, foi reprimida e invisibilizada tanto na esfera pública quanto na familiar. Os espaços de expressão resumiam-se apenas a contextos prescritos, como os âmbitos domésticos, com o objetivo de assegurar algumas funções que lhes são impostas pelo patriarcado, que em muitas culturas ainda exerce poder acentuado. Assim, o silenciamento dita as regras de conduta e o feminino é marcado a ferro, com insígnias que conferem valores e papéis que assumem visibilidade na maternidade, no matrimônio e na conservação da família. São rechaçadas ao se empoderarem, sendo consideradas indisciplinadas, prostitutas, feiticeiras, místicas ao se comportarem de maneira 'destoante' dos padrões sociais impostos pela sociedade machista e sexista que cerceia as vozes desse feminino agonizante. Essa realidade permeia as linhas literárias e assinala, ao longo de uma linearidade, sociedades que se comportam de maneira distinta em relação à atuação desse feminino, algo que podemos constatar no estilo da escrita de José Saramago. É reluzente em sua escrita, espaços para a sensibilidade feminina, conferindo às mulheres o papel de conquistadoras em vez de conquistadas, com o poder de julgar e condenar o protagonista da obra. Como exemplo dessa singularidade, destaca-se a peça teatral 'Don Giovanni ou o Dissoluto Absolvido', de José Saramago (2005). Nessa narrativa, questões ligadas ao universo feminino são evidenciadas, e as personagens femininas funcionam como uma chave mestra para o desvendar do enredo, como podemos constatar na frase: 'Deus e o Diabo estão de acordo em querer o que a mulher quer' (Saramago, 2005). Desse modo, a obra também aborda, de forma crítica, questões como o patriarcalismo, o machismo e o poder nas relações afetivas, convidando o leitor a mergulhar em técnicas estilísticas e narrativas capazes de nos envolver nessa diegese. É como uma espécie de glândulas sericígenas que nos tecem com fios de seda no universo literário, em busca de beber dessa fonte enriquecedora que arrebata e, ao mesmo tempo, nos liberta, devido aos fios meticulosos que funcionam como um êxtase que transcende o corpo e adentra a alma. Os fios da ficção saramaguiana abrem espaço para a voz feminina, que se insere não apenas como objeto de desejo, mas como sujeito de desejo, com complexidades particulares, um corpo lascivo. Com efeito, nosso olhar se debruçará sobre a personagem Zerlina, uma mulher que, no decorrer da trama, é procurada na casa de Don Giovanni por seu marido como vítima das conquistas desse Don Juan. Na trama, ela transcende do lugar de conquistada para conquistadora. Essa circunstância de transgressora será analisada pelo viés da psicanálise, onde beberemos dos construtos do mestre vienense Sigmund Freud para situar o feminino nesse lugar transgressor dentro desse arcabouço literário.

Palavras-chave: Psicanálise; Literatura; Feminino; Transgressão

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